Tampo de secretária em prancha de cedro

Numa época de abandono dos escritórios, uma prancha maciça de cedro proveniente de Sintra é cortada, limpa, aplainada e acabada para ser usada como tampo de secretária e transformar uma divisão com um pedaço de Natureza, para que nem só o trabalho entre em casa. Não é trivial para um espaço, e para uma mente suficientemente em paz para o notar, o efeito da substituição de um tampo utilitário branco por uma prancha de madeira de proporções certas.

A meio de uma pilha de pranchas de cedro encontramos aquela com a profundidade ideal e os contornos mais atraentes, com uma irregularidade certinha interrompida pelo que resta de um galho. Um X a caneta marca a prancha enamorada a ser removida. Encontro a prancha no dia seguinte já ao alto e pela primeira vez mostra o labirinto de veios, nós e fissuras impossíveis de adivinhar no dia anterior. Os cortes que definirão a largura da secretária são ditados pelos caprichos da madeira, de forma a evitar as grandes fissuras, e depois de cortada a prancha segue para a calibradora que remove a textura grosseira deixada pela máquina de corte que transformou a árvore em pranchas.

O Sr. Francisco acerta o preço. "Para si", diz. Aponta as ondulações do veio e gaba a prancha, que os olhos experientes vêem já como se tivesse acabamento. Despede-se desejando, numa forma eloquente de que já não me lembro, que apreciemos o tampo, com a certeza de que será "para gerações".

Já em casa, a prancha é sujeita a um trabalho de limpeza resumido a sanar a madeira, de forma a remover apenas o que está degradado mais toda a camada envelhecida que pertencia ao contorno da árvore. É um trabalho quase ausente de opções estilísticas e a remoção de madeira degradada pára quando encontro resistência. A Natureza que decida. Não existe melhor solução para a tendência de paralisia perante um mundo de opções. As opções limitaram-se ao preenchimento dos vazios deixados pela limpeza de zonas degradadas com uma massa de cola e serradura de madeira escura, contrastante com o tom claro do cedro e evidenciando o que não lhe pertence.

A plaina entra ao trabalho apenas para restabelecer a planura das zonas dos nós, mais densas, que fissuram e empenam com a progressiva perda de humidade começada quando a prancha foi removida do armazenamento ao ar livre na serração. Durante o primeiro mês de armazenamento em casa, a uma humidade ambiente inferior, a prancha empena também ligeiramente, de forma quase imperceptível a olho nu. E para o olho que o perceba, esse empenamento será apenas coerente com o aspecto natural desejado, não demasiado diferente do aspecto de um pedaço de madeira simplesmente arrancado à Natureza.

Para manter expostos e intocados os contornos naturais da prancha, é feita uma passagem para que os cabos dos equipamentos em cima da secretária possam ser organizados num suporte instalado na face inferior, que mantém escondidos também, e longe do chão, adaptadores e extensões.

O tampo é acabado com um verniz aquoso de poliuretano, para manter tanto quanto possível o tom natural do cedro e evitar o ligeiro amarelecimento provocado por vernizes oleosos. O verniz cumpre também aqui a função de adensar ligeiramente e proteger a superfície desta madeira suave para que resista às exigências de uma superfície de trabalho. A face inferior é deixada sem acabamento, para que funcione como um gigante ambientador e preserve a memória de uma viagem ao Buçaco.

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